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Artigo de Prof. Misabel Derzi em destaque no Correio Braziliense


O Jornal Correio Braziliense publica artigo de Professora Misabel Derzi em sua edição de hoje, discutindo a capacidade tributária do país.

 

 

Capacidade tributária

 

Misabel Abreu Machado Derzi
Professora de Direito Tributário da UFMG, sócia do escritório Sacha Calmon–Misabel Derzi Consultores e Advogados, membro da Academia Internacional de Direito e Economia e presidente da ABRADT

 

O peso da carga tributária deve ser compatível com as riquezas produzidas em uma sociedade, de modo a não se travar o desenvolvimento econômico. Essa questão tem merecido os mais calorosos debates, pois uma carga justamente distribuída, de cerca de 36% do PIB nacional, pode não ser impeditiva do progresso social. Não obstante, ela é justamente criticada em nosso país pelo fato de emperrar o desenvolvimento econômico, castigar com mais intensidade as famílias mais pobres e os entes políticos mais carentes (como os municípios), concentrando renda e poder de forma nociva.

 

No Brasil, os investimentos produtivos esbarram em um sistema tributário amplamente cumulativo, em que os tributos federais sobre o consumo, como o IPI e as contribuições sobre o PIS/Cofins, incidem sobre o ICMS dos Estados e o ISSQN dos municípios, embutidos no faturamento/receita das empresas. Assim, as alíquotas efetivas são muito superiores, pois os tributos caem uns sobre os outros, em cascata. Isso contrasta com o IVA não cumulativo, considerado o melhor imposto de mercado, instituído em mais de 130 países, inclusive China e Japão. No Brasil, ainda toleramos ampla cumulatividade sobre a produção. Ocorre ainda que os investimentos produtivos, se elevados, podem levar determinadas empresas a amargar prejuízos em determinado exercício, que, no imposto sobre a renda, não podem ser compensados com até 30% dos lucros de exercícios subseqüentes.

 

Essa trava obriga as empresas a pagar o IRPJ e a CSLL sobre lucro inexistente, ou seja, sobre os 70% restantes, que são lucro fictício, se os prejuízos são maiores do que o limite de 30% à dedução. No Brasil, transforma-se o imposto sobre a renda em imposto sobre a atividade econômica (independentemente de seu resultado), para a que Fazenda arrecade de qualquer maneira. Paga-se tributo sem a necessária capacidade contributiva. A tendência, nos países desenvolvidos, é oposta, para capitalizar rapidamente a iniciativa empresarial, permitindo-se a dedução dos prejuízos retroativamente (em exercício anterior, em que houve lucro e pagamento de imposto, o que gera crédito para o contribuinte em face da Fazenda), indo, ainda, o saldo dos prejuízos, se houver, à compensação com exercícios futuros. Isso sim, muda o perfil das empresas e de suas ações em bolsa.

 

O tema capacidade contributiva é valor que se presta à realização de outros valores, como a igualdade, cerne do próprio princípio da Justiça. Pagar o tributo de acordo com a capacidade contributiva de cada contribuinte é, no entanto, entre nós, um dos aspectos mais negligenciados. É que os tributos incidentes sobre o consumo, como o ICMS e as contribuições PIS/Cofins, estão ocultos no preço das mercadorias e serviços adquiridos e sacrificam mais impiedosamente as famílias de baixa renda. Referindo-se a essa “carga tributária invisível”, o senador Francisco Dornelles salienta, com base em pesquisa de economistas da USP, que as famílias que ganham até dois salários mínimos suportam em impostos um peso de 48% sobre sua renda, enquanto aquelas de renda superior a 30 salários mínimos somente 26%. Enfim, a “proporção dos impostos diminui à medida que a renda aumenta”, preconizando aquele senador maior transparência e conscientização dos cidadãos como estratégia para correção das injustiças sociais (Folha de S.Paulo,12/8/07, p.A3).

 

A injustiça da distribuição da carga é tão grande que atinge até as relações entre os entes da Federação. É que os municípios são grandes pagadores de tributos à União e aos estados. Em suas despesas, suportam, como os contribuintes, o IPI, as contribuições PIS/Cofins e o ICMS, embutidos nos preços dos bens do ativo e de uso e consumo que adquirem. Estudos feitos em Belo Horizonte registram que esse município devolve pelo menos 20% dos recursos que recebe dos Fundos à União e aos estados, por meio dos impostos que lhes paga em suas compras. Na França, as municipalidades são compensadas do IVA que suportam em suas aquisições.

 

A capacidade contributiva se entrelaça com o respeito às garantias constitucionais da propriedade e da segurança, da vedação do confisco, da preservação das empresas, do direito da concorrência e da liberdade e proteção das famílias. Com a reforma tributária em pleno debate no Congresso, conviria que se examinassem as considerações aqui expostas na formulação do modelo que se pretende moldar na Constituição.

 

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