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Igor Mauler Santiago fala à Folha de São Paulo


O jornal A Folha de São Paulo, em sua edição de hoje, veicula notícia sobre o anúncio da Receita Federal que acelerará a cobrança das dívidas das empresas. Igor Mauler Santiago foi entrevistado para comentar o assunto.
Fisco acelera cobrança de dívida de empresas
Depois de reter restituições do IR de pessoas físicas, Receita busca fazer caixa com recursos de pessoas jurídicas inadimplentes
Primeiro lote de cobranças foi enviado neste mês a 110,6 mil empresas que devem R$ 4,7 bi; dessas, 2.341 devem R$ 2,1 bi
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Depois de segurar o pagamento da restituição do Imposto de Renda das pessoas físicas, a Receita Federal anunciou ontem que vai acelerar a cobrança de dívidas das empresas para tentar aumentar a arrecadação. O alvo do fisco são as empresas inadimplentes que confessaram dever impostos e contribuições nas declarações entregues, mas não fizeram o recolhimento em dinheiro.
O primeiro lote de cobranças foi enviado neste mês a 110,6 mil empresas que devem R$ 4,7 bilhões. As maiores chances de aumento na arrecadação estão acumuladas em 2.341 grandes empresas que devem, juntas, R$ 2,1 bilhões.
“Faz parte de um programa de combate à inadimplência. Claro [que é um esforço para aumentar a arrecadação]. Sempre tem a ver com a crise, mas, independentemente disso, se o contribuinte lançou, não tem por que não pagar”, disse o coordenador-geral de Arrecadação e Cobrança da Receita, Marcelo Lins.
No segundo semestre do ano passado, com a crise internacional e a dificuldade de obter crédito nos bancos, as empresas começaram a se financiar por meio do não pagamento de impostos. O aumento de juros naquele momento fez com que fosse mais vantajoso pagar a multa do tributo em atraso do que a taxa exigida pelos bancos.
Dados da Receita mostram que a inadimplência dobrou com a crise. Entre outubro de 2008 e janeiro deste ano, as grandes empresas deixaram de pagar R$ 300 milhões por mês. No período anterior à crise, o valor acumulado era de R$ 150 milhões mensais.
A esperança do governo é que a ameaça de inscrição desses contribuintes em dívida ativa para cobrança judicial, assim como a impossibilidade de as empresas obterem a CND (Certidão Negativa de Débitos), necessária para conseguir financiamentos em bancos oficiais e participar de licitações, entre outras coisas, seja suficiente para que os inadimplentes paguem suas dívidas.
Prazo até novembro
“Quem declara tributo devido é o bom contribuinte. Se não paga, é por uma dificuldade de caixa. A cobrança mais ágil deve levar a um esforço maior de pagamento por parte dos contribuintes”, afirma o advogado Igor Mauler Santiago, sócio do escritório Sacha Calmon e Misabel Derzi.
A Receita deu prazo até 30 de novembro para que os contribuintes notificados façam o pagamento. Se isso não acontecer, serão inscritos na dívida ativa para cobrança judicial. Esses são contribuintes que confessaram a dívida em impostos e não fizeram o recolhimento. Não se trata, portanto, de fiscalização.
As cobranças enviadas no início do mês dizem respeito à inadimplência acumulada entre janeiro e agosto deste ano e ao que não foi pago pelas pequenas empresas no segundo semestre de 2008. O estoque anterior a essas datas poderá ser parcelado até o fim de novembro por meio do Refis. Se não for, será também enviado à dívida ativa da União.
Para correr atrás desses devedores confessos, a Receita Federal mudou apenas um procedimento administrativo. Até agora, o fisco recebia as declarações das empresas e fazia um cruzamento com os valores recolhidos para ver o saldo devedor. Mas a cobrança só era feita semestralmente ou a cada ano.
A partir de agora, a notificação será feita no mês seguinte à entrega da declaração. Com isso, quem ficar inadimplente não terá mais prazo para fazer o pagamento sem que seja incomodado pelo fisco.
repercussão
Medida elevará custos, dizem especialistas
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
A mudança no procedimento da Receita para a cobrança de dívidas deve provocar aumento nos custos das empresas, de acordo com especialistas.
Com a aceleração da cobrança, as empresas terão agora menos tempo para pagar suas dívidas. “Será necessário um controle maior para ficar em dia com o fisco. As empresas terão de tomar mais cuidado. E isso implica custos maiores nas áreas de “compliance” [para garantir o cumprimento das obrigações com o fisco]”, disse o tributarista Waine Domingos Peron, do escritório Braga & Marafon.
Isso porque a Receita Federal modificou um procedimento administrativo. Antes, o fisco, após analisar as declarações das empresas, efetuava a cobrança semestralmente ou a cada ano. Agora, a notificação será feita um mês depois da entrega da declaração.
“Com isso, a Receita fecha o cerco às empresas e elas ficam mais vulneráveis. Um erro no preenchimento da declaração, por exemplo, pode levá-las a ser notificadas mais rapidamente”, afirma o advogado.
Se um contribuinte é inscrito na dívida ativa para cobrança judicial, fica impossibilitado de participar de licitações públicas e, em alguns casos, privadas. “Isso pode levar uma empresa a perder “o negócio do ano”.”
De acordo com o advogado Flavio Porta, do escritório Libertuci Advogados Associados, as empresas ficam agora mais pressionadas.
“Quem já contava com um prazo maior até ser notificada pelo não pagamento agora não terá mais isso. Então, nesse sentido, haverá impacto para a empresa”, diz Porta. Para ele, está clara a intenção do governo de reforçar o caixa, a exemplo do que fez ao segurar a restituição do IR das pessoas físicas.
(PAULO DE ARAUJO)
Atraso em restituição foi por necessidade, diz Lula
FÁBIO ZANINI
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Na primeira declaração pública sobre o atraso do governo em liberar as restituições do Imposto de Renda das pessoas físicas, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse ontem que foi preciso tomar essa atitude não por desejo, mas por necessidade. Segundo o raciocínio do presidente, os contribuintes não estão sendo prejudicados, porque o dinheiro da restituição está sendo remunerado com a taxa Selic.
Conforme a Folha revelou anteontem, a queda na arrecadação federal e a manutenção do alto padrão de gastos do governo jogarão para o ano que vem cerca de R$ 3 bilhões em restituições a que os contribuintes teriam direito ainda neste ano.
“Acho falta de compreensão achar que o governo teria interesses econômicos em reter o Imposto de Renda, porque nós pagamos a taxa Selic [sobre o dinheiro retido]. Portanto, nós não temos nenhum interesse de reter [as restituições]”, declarou o presidente, durante cerimônia na sede do Ministério das Relações Exteriores ao lado do presidente da África do Sul, Jacob Zuma.
Lula demonstrou certa irritação com o assunto e parecia ansioso para dar explicações. Sem entender direito a questão de um jornalista sobre o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), por exemplo, chegou a perguntar se ela se referia ao IR.
Assessores do governo identificaram possível prejuízo político caso fique cristalizada a interpretação já alardeada pela oposição de que o governo está sacrificando a classe média.
Lula tentou minimizar a importância da polêmica, afirmando que a medida não é inédita. “Não é a primeira vez na história do Brasil, nem na história mais velha nem na história mais nova, que em alguns momentos, por problemas de receita, a emissão dos pagamentos [da restituição] pode atrasar 10 ou 15 dias.”
Sem precisar datas, Lula afirmou que o oposto também já aconteceu em seu governo. “Nós também já pagamos adiantado [a restituição].”
Interesse no consumo
O presidente declarou que o interesse maior do governo é que as pessoas tenham mais dinheiro para consumir.
“Não há nenhum interesse de que essas coisas aconteçam, porque o que nós queremos é que o povo tenha mais dinheiro para consumir”, disse ele.
O presidente repetiu um discurso frequente de seus ministros, de que o Brasil precisa viver um “círculo virtuoso” de crescimento, que se inicia com a irrigação da economia.
“Se o povo tiver dinheiro na mão, quem vai ganhar é o consumo, são os índices de produtividade das empresas e os índices de comércio.”
Entre junho e outubro, houve queda de 21,7% nas restituições na comparação com igual período do ano passado -de R$ 7 bilhões para R$ 5,48 bilhões. As maiores reduções foram em agosto e em setembro, quando os valores devolvidos aos contribuintes foram reduzidos a menos da metade dos números de 2008.
A devolução do IR se dá quando o contribuinte paga mais imposto do que devia, gerando saldo a ser recebido do governo. As restituições são feitas de junho a dezembro, com as devoluções referentes às declarações retidas em malha fina podendo ser estendidas para os anos subsequentes.
Frase
Acho falta de compreensão achar que o governo teria interesses econômicos em reter o Imposto de Renda. (…) Nós não temos nenhum interesse de reter [as restituições]
LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
presidente da República
ANÁLISE
Governo faz de tudo para reforçar o caixa
LEANDRA PERES
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
A decisão de apertar o cerco aos contribuintes inadimplentes é apenas mais uma da lista de medidas de um governo que procura receita por todos os lados para fechar suas contas. Até agora, a solução tem sido aplicar remendos em vez de cortar gastos. E torcer para que a arrecadação reaja logo à retomada da economia e também cresça.
Em agosto, por exemplo, metade do superavit do Tesouro Nacional foi resultado de receitas extraordinárias. O levantamento do economista Maurício Oreng, do Itaú Unibanco, mostra que o governo arranjou R$ 1,8 bilhão com a chamada “conversão de depósitos judiciais”, que nada mais é do que contabilizar como receita recursos que ainda estão em disputa na Justiça. A alegação oficial é que as chances de vitória são muito grandes e, portanto, é dinheiro líquido e certo.
Mas a fonte dos milagres fiscais foram mesmo as estatais. Em agosto, o governo recebeu R$ 7,8 bilhões em dividendos, valor sem precedente na história. De janeiro a agosto, o pagamento de dividendos somou R$ 17,9 bilhões, muito mais do que os R$ 10,1 bilhões previstos para 2009 pela lei orçamentária.
O governo também conta com o dinheiro que vai entrar com o parcelamento de dívidas e, agora, com a cobrança dos inadimplentes. Isso tudo deve reforçar o caixa de novembro e dar fôlego para o aumento de despesas típico de final de ano.
O Tesouro Nacional também voltou a controlar as despesas na boca do caixa. Quando tem dinheiro, paga. Se não tem, segura o pagamento. Isso fez com que os gastos sobre os quais a União tem controle recuassem em agosto quando comparados com o mesmo mês de 2008. Mas as despesas com pessoal saltaram e, quando analisados em conjunto, os gastos federais crescem neste ano 12% acima da inflação. No ano, o economista do Itaú Unibanco estima um crescimento de 14% nas despesas federais.
O aumento de gastos do governo não é novidade. Resolver o problema pelo lado da receita é muito mais fácil do que enfrentar o lobby do funcionalismo público. Também foi assim nos dois governos do tucano Fernando Henrique Cardoso.
A diferença é que, até 2002, aumentar impostos era uma saída aceitável. Agora não é mais. Basta lembrar que o Congresso derrubou a prorrogação da CPMF (o chamado imposto do cheque), apesar de todo o cenário de caos alardeado pela equipe econômica.
Se até o final do ano a arrecadação der sinais de melhora, o governo terá saído do sufoco. Se não for o caso, será complicado sustentar um resultado positivo nas contas públicas com receitas extraordinárias, por mais que as estatais sejam obrigadas a ajudar, e os contribuintes, apertados para pagar.

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