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Igor Mauler Santiago fala ao Jornal do Commercio sobre execução fiscal
06 de maio de 2008
Em matéria sobre o projeto de lei que visa modificar o processo de execução fiscal, o Jornal do Commercio entrevistou Igor Mauler Santiago em sua edição de hoje.
Nova execução contestada
GISELLE SOUZA
DO JORNAL DO COMMERCIO
O projeto de lei que visa à modificação do processo de execução fiscal no Brasil sequer chegou ao Congresso, mas advogados especializados na área tributária já começam a preparar a ofensiva no caso de a norma realmente entrar em vigor. A proposta foi apresentada pela Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN) em março, após intensa negociação com representantes da magistratura, que eram contrários ao texto inicial. A mudança, porém, não agradou os contribuintes. A maior crítica está relacionada à possibilidade de a União bloquear os bens dos devedores sem prévia autorização do Judiciário. Na avaliação deles, a medida é inconstitucional.
Pela proposição, procedimentos administrativos, então realizados pela Justiça, passam a ser de competência da PGFN. Assim, poderão tornar-se atribuições da Fazenda a notificação dos devedores, a identificação do patrimônio deles e até a possibilidade de efetuar o bloqueio temporário do patrimônio dos contribuintes para assegurar a penhora. Na ocasião em que o projeto foi apresentado, o procurador geral da Fazenda Nacional, Luís Inácio Adams, explicou que o órgão teria até três dias para ajuizar a execução fiscal se o bloqueio ocorresse sobre dinheiro, ou até 30 dias se fosse sobre outros bens.
Segundo o advogado Fábio Garuti Marques, escritório Peixoto e Cury Advogados, se aprovada, a proposta será o mesmo que um tiro no pé: ao invés da tão esperada redução do acervo processual, as medidas apresentadas poderão levar cada vez mais contribuintes a ingressar na Justiça para não se verem lesados.
De acordo com ele, a possibilidade de a Fazenda bloquear bens implicará a quebra do sigilo bancário, que é garantido pela Constituição. O projeto prevê o acesso ao sistema de penhora online do Banco Central , pelos procuradores. "Isso seria inconstitucional, porque a Fazenda teria acesso a transações bancárias, depósitos e transferências. Essa possibilidade de bloqueio, pelo Bacen-Jud, iria culminar em uma série de injustiças", afirmou Fábio Garuti Marques.
O advogado explicou que muitas das ações de cobrança são improcedentes. "Pelo menos 60% das execuções que tenho em meu escritório são indevidas, pois consigo comprovar o recolhimento por Documento de Arrecadação da Receita Federal (DARF)", explicou Marques, ressaltando que, no processo judicial atual, os magistrados suspendem a penhora até a Fazenda se manifestar. "Agora imagine a possibilidade de a Fazenda poder efetuar o bloqueio primeiro. Quando o contribuinte procurar o Judiciário, o dano já estará feito. Que seja por três dias. A empresa já terá tido prejuízo. Poderá ter deixado de pagar fornecedores ou empregados", acrescentou.
Na avaliação do advogado Igor Mauler Santiago, do escritório Sacha Calmon – Misabel Derzi Consultores Advogados, o projeto usurpa a competência do Judiciário ao permitir que o credor, no caso a Fazenda, também atue como juiz no processo em que é parte. Em relação ao bloqueio, Santiago lembrou que a legislação estabelece uma hierarquia de bens para a realização da penhora, sendo a primeira possibilidade sobre dinheiro.
A jurisprudência, entretanto, permite a flexibilização da regra nos casos em que a exigibilidade do crédito pode inviabilizar a atividade da empresa. Assim, nos casos em que não acarretar prejuízos para o credor, o Judiciário pode decretar a penhora de um imóvel ao invés do dinheiro da empresa quando verificado que o valor é destinado ao pagamento dos empregados, por exemplo.
"O grande beneficiário da execução é o credor, mas isso não quer dizer que se tenha que atropelar o devedor", explicou Santiago, destacando que o projeto pode pôr esse entendimento por terra. "Se o credor é quem escolhe, ele vai pegar o bem que mais lhe interessar", acrescentou o tributarista, referindo-se a possibilidade de a PGFN realizar bloqueios para assegurar a penhora.
A advogada Juliana Moura Borges Macksoud, do escritório Braga & Marafon, também é contra o projeto de lei. Segundo afirmou, o texto vai de encontro a Constituição. "O artigo 5º, inciso 54 da Carta diz que ninguém estará sujeito a sofrer agressões em seu patrimônio sem o devido processo legal, onde está incluído o processo administrativo. Só que o projeto inverte isso. Primeiro o contribuinte tem que oferecer garantias para depois ser ouvido", criticou a especialista.
EXECUÇÃO. O projeto de lei da PGFN visa a tornar a cobrança fiscal judicial mais ágil. Levantamento do órgão mostra que uma ação, atualmente, demora quase 16 anos para ser concluída – a média de duração da fase administrativa é de quatro anos; da judicial, 12. Um dos motivos da morosidade é o fato de todas as etapas terem que ser conduzidas por um juiz, que decide desde a citação do contribuinte até o arresto dos bens para o pagamento do crédito devido. De acordo com o estudo, o estoque da Dívida Ativa da União, incluída a Previdência Social, é hoje de R$ 650 bilhões. A esse valor soma-se o montante de R$ 1,3 trilhão ainda em discussão dentro do órgão.
Para mudar esse quadro, a proposição cria o chamado Sistema Nacional de Informações Patrimoniais dos Contribuintes: banco de dados pelo qual os procuradores poderão identificar os bens dos devedores para garantir a penhora. O cadastro seria alimentado com informações mensais a serem fornecidas por todas as instituições, públicas e privadas, responsáveis pelo registro e controle de bens móveis e imóveis, tais como automóveis, embarcações, aeronaves, ações na bolsa de valores, entre outras. As secretárias da Fazenda dos Estados e municípios também teriam que informar, mensalmente, dados relativos à situação patrimonial dos contribuintes.
A própria PGFN reconhece, entretanto, que as medidas apresentadas, por si só, não são suficientes. "Temos várias medidas que ainda serão anunciadas", disse Adams, destacando outras propostas, inclusive de lei. Entre elas, está um projeto para possibilitar a recuperação de créditos inferiores a R$ 10 mil, que não podem ser cobradas por via judicial. "Um de nossos projetos prevê a possibilidade de cobrança amigável por meio de uma instituição financeira", disse Adams, explicando que a cobrança poderá ser feita por banco oficial ou privado, que tenha sido selecionados por licitação.
Outra proposta é a que visa à inscrição do devedor nos cadastrados de proteção ao crédito. "A pedido do Congresso, a proposta está suspensa para maior debate", destacou.