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Correio Brasiliense traz opiniões de Sacha Calmon sobre carga tributária no Brasil

27 de setembro de 2016

O jornal Correio Brasiliense publicou suplemento especial intitulado Carga Tributária, com opiniões dadas pelo professor Sacha Calmon no “Correio Debate – Carga Tributária no Brasil”, evento realizado na última terça-feira, no Distrito Federal, para discutir os entraves ao desenvolvimento econômico do país.

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6d59d951-585f-4748-a98c-9aa42b2f8039Offshores na mira

O Brasil precisa passar urgentemente por uma mudança na estrutura de gastos. Se as alterações forem adiadas e o país só depender do aumento de receitas, mais a economia sofrerá. “A receita é serviçal da despesa. Se o governo aumenta a despesa, a receita diminui. O governo se apropria como sócio privilegiado de tudo o que a Nação produziu em determinado ano”, protestou Sacha Calmon, professor das faculdades federais de Direito do Rio de Janeiro e de Minas Gerais, além de sócio do escritório Sacha Calmon.

O secretário da Receita Federal, Jorge Rachid, explicou que a meta não é estabelecer alíquotas a patamares dos Estados Unidos, de 39% do Produto Interno Bruto (PIB). “Para nós, é muito difícil, porque o dinheiro não tem pátria”, disse, se referindo ao risco que essa decisão poderia acarretar de maior fuga de capitais para os chamados paraísos fiscais. Essa é, atualmente, a grande preocupação, inclusive, entre as nações mais desenvolvidas, reunidas no grupo G-20. O uso de offshores para transferências de lucros e dividendos de multinacionais tem impedido uma recuperação mais rápida da economia mundial, de acordo com os dirigentes das grandes economias. Além das remessas revestidas de legalidade, há necessidade de enfrentar outro inimigo das empresas que cumprem os compromissos legais: o comércio informal, a pirataria, o contrabando.

image005 (1)Alfândega

“Só há duas formas de conseguir arrecadar mais: aumentando alíquotas ou a base. Ou seja, combatendo a sonegação e fazendo quem não paga imposto começar a pagar”, afirmou o deputado Efraim Filho (DEM-PB), presidente da Frente Parlamentar Mista de Combate ao Contrabando e Falsificação. “O poder público, infelizmente, tem preferido a solução mais fácil: aumentar imposto. Só que isso nao é mais sustentável, as empresas estão fechando as portas”, declarou.

O secretário da Receita comentou inciativas para coibir essa prática. “Não sei se vocês tiveram oportunidade de passar nas nossas alfândegas, depois das Olimpíadas, quando lançamos o uso de reconhecimento facial para autuar contrabandistas”, observou. Segundo ele, “quando um viajante embarca na Europa, às 9 horas, a fiscalização já recebe os seus dados para serem analisados. Com base nessas informações, o analista tributário seleciona o contribuinte a ser fiscalizado no momento do desembarque”.

Ele contou que esse novo sistema já permitiu detectar comerciantes de pedras preciosas e de drogas. “E foi muito mais fácil. O objetivo não é complicar a vida do cidadão, não queremos isso. Queremos evitar fazer uma abordagem de forma desnecessária, que enseje constrangimento, e focar nos contribuintes que cometem ilícitos”, frisou.
Simplificar a cobrança de tributos é urgente

Um consenso, entre especialistas, é a necessidade de simplificar o sistema tributário. O que varia é a opinião sobre como isso deve ser feito. “Com seriedade e paulatinamente”, acredita o professor Sacha Calmon, sócio-fundador do Sacha Calmon – Misabel Derzi Consultores e Advogados. Para ele, é essencial que haja participação da sociedade civil, do Legislativo e da administração pública, que devem decidir, em conjunto, as medidas a serem tomadas.

Na opinião de Calmon, o problema não reside no modelo previsto na Constituição, mas no que se tornou a prática. “O sistema é excelente. Dificilmente vamos encontrar um país no mundo com a mesma organização tributária que tem o Brasil. O que há são distorções quando ele se põe a funcionar”, afirmou. Uma delas, segundo ele, é a forma como os tributos são cobrados. “Quem lança a maioria dos impostos é o contribuinte, que se obriga a conhecer uma montanha de leis, instruções normativas e pareceres. E, se errar, tem multas de 100% sobre o valor que deixou de recolher. É uma brutalidade que se faz com o cidadão brasileiro”, declarou

image004Servidão
A afirmação do advogado encontra respaldo. Os brasileiros levam em média cinco meses por ano trabalhando apenas para pagar tributos, de acordo com o Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBTP). “É um sistema de servidão ao Estado. Ouso dizer que, nem na época do feudalismo, havia uma servidão tão grande assim”, reforçou o advogado Cristiano Carvalho, da CMT Advogados. Ele acrescentou dados do Banco Mundial de que empresas brasileiras consomem 2,6 mil horas por ano tentando cumprir suas obrigações com o Fisco. “Isso equivale ao tempo dispendido para conhecer a legislação, compreender e, se conseguir, cumpri-la”, ponderou o advogado. Na opinião dele, o sistema brasileiro é “provavelmente um dos piores do mundo” e a reforma, “mais do que necessária”.

Tributar prioritariamente bens e serviços em detrimento da renda, como ocorre no Brasil, é outro ponto considerado discutível. “Quando se tributa bens e serviços, pega-se uma parte maior da população. E, talvez, não se esteja tributando de forma equânime quem tem mais capacidade para contribuir. Tributar menos a renda e mais bens e serviços talvez esteja penalizando mais a sociedade”, considerou Roberto Haddad, sócio responsável pelo departamento Tributário na KPMG no Rio de Janeiro. Já Everardo Maciel, ex-secretário da Receita Federal e presidente da Logos Consultoria Fiscal, discorda: “Não se faz distribuição de renda com imposto e, sim, com os gastos”.

Como forma de melhorar a arrecadação, Evandro Guimarães, presidente do Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial (Etco), defende que todos os produtos que entram no Brasil deveriam pagar tributos. “Esse sistema de gifts, de que até um determinado valor não paga imposto, deve ser avaliado de maneira cuidadosa”, assinalou.

Para o diretor de Políticas e Estratégia da Confederação Nacional da Indústria (CNI), José Augusto Fernandes, há duas questões centrais na discussão sobre tributos: a reforma da Previdência e a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que limita os gastos públicos à inflação do ano anterior, em tramitação no Congresso. “Por vezes, as empresas estão focadas na carga e esquecem que ela é construída pelo gasto. É uma discussão muito importante, já que a receita decorre do padrão de despesas da sociedade”, argumentou.

“Observando o cenário atual, ninguém tem muitas fantasias sobre a capacidade de grandes mudanças nos próximos dois anos”, disse Fernandes. Ele acredita, no entanto, ser possível avançar no aperfeiçoamento de determinadas áreas, como a discussão sobre custos de processos, certidões e cadastros. Para ele, o sistema tributário vigente reduz o potencial de crescimento das empresas brasileiras, afeta a capacidade de exportação e tributa excessivamente os investimentos.

Resistência
No meio empresarial ainda há reservas para apoiar uma reforma tributária, afirmou Fernandes, da CNI. “Mesmo com os riscos da crise fiscal que está instalada, há empresas com medo que o PIS-Cofins aumente na hora da reforma”, disse. “As empresas foram se adaptando e criaram seus regimes especiais. O ideal é que o sistema seja mais horizontal e menos discricionário”, defendeu. Segundo ele, o sistema atual induz os empresários à busca do regime especial. “Como a tributação de investimentos é elevada, todo o setor que se sente importante na economia luta para ter sua isenção de PIS-Cofins para que não tribute seu investimento. Isso porque o competidor não seria tributado da mesma forma lá fora”, explicou. Fernandes destacou ainda que uma planta industrial com as mesmas configurações tem custo tributário de investimento maior no Brasil do que em países como Austrália, México e Inglaterra, por conta de intervenções de créditos tributários.

R$ 1 trilhão transita na informalidade

O mercado informal movimentou quase R$ 1 trilhão, ou seja, 16,2% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro em 2015. O cálculo é do Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial (Etco), que, em parceria com o Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV), mede o Índice de Economia Subterrânea: a produção de bens e serviços que as empresas não declararam ao Fisco, sonegando impostos. “Esse valor é alto demais, maior do que o PIB da Argentina. É o dobro do que seria razoável aceitar”, afirmou o presidente executivo do Etco, Evandro Guimarães.

Ele ressaltou que o problema não é o comércio popular, mas o descumprimento das leis tributárias. “O comércio popular é bem-vindo, desde que não seja ilegal”, disse. O importante é que os produtos cheguem ao país em conformidade com a lei, de forma que os preços sejam negociados de maneira justa. “Tratar tudo como bagatela tira escala e competitividade da indústria”, emendou.

Em 2015, impactado pela crise econômica, o mercado informal voltou a crescer depois de 11 anos, de acordo com o Índice de Economia Subterrânea. Quando começou a ser calculado, em 2003, o indicador representava 21% do PIB. Desde então, caía ano após ano, e chegou ao nível mais baixo em 2014: 16,1%, voltando a subir no ano passado.

Nessa situação, aumentar qualquer tributo prejudicaria, ainda mais, a produção nacional, alertou Guimarães. “Estimularia a pirataria, a sonegação, a falsificação e o contrabando”, disse.

Além disso, os preços dos produtos legais ficariam mais altos e, portanto, menos competitivos. “Quando se aumenta o tributo sobre bens e serviços, o custo é repassado aos consumidores finais. Se os preços subirem muito, cresce a inflação”, explicou o professor Sacha Calmon, sócio-fundador do Sacha Calmon – Misabel Derzi Consultores e Advogados. “Os Estados Unidos, que têm uma fronteira terrestre de 12 mil quilômetros, contam com sete vezes mais agentes que o Brasil” Cristiano Carvalho, advogado tributarista e professor da Universidade de São Paulo (USP).

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