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Igor Mauler fala à Folha de São Paulo sobre pagamento com precatórios

03 de outubro de 2009
O jornal A Folha de São Paulo, em reportagem veiculada em sua edição de hoje, entrevistou Igor Mauler Santiago para comentar sobre a possibilidade de se pagar o ICMS utilizando precatórios.
 
 
 
Univen tenta pagar ICMS com precatórios
 
Preço da gasolina da refinaria, instalada em Itupeva, no interior paulista, é menor do que o da Petrobras  FÁTIMA FERNANDES CLAUDIA ROLLI ENVIADAS ESPECIAIS A ITUPEVA (SP) 
Desde janeiro deste ano, a Univen, fabricante de gasolina localizada em Itupeva, no interior de São Paulo, tenta pagar com precatórios cerca de R$ 1,8 milhão por mês de ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) sobre a venda do combustível.
 
Precatórios são créditos reconhecidos pela Justiça com origem em processos de servidores contra o poder público (União, Estados e municípios). As empresas têm interesse nos precatórios porque conseguem adquirir esses créditos com deságio de até 75%. Isto é, para adquirir um precatório de R$ 100, desembolsam R$ 25.
 
"Essa é uma prática empresarial comum e legal, utilizada por nós e por empresas de vários setores. Adquirimos os precatórios de pessoas físicas [com deságios de até 50%] e entramos com pedido na Secretaria da Fazenda para abater os créditos do valor do imposto que temos a pagar todo o mês", diz Alexandre Argoud Malavazzi, sócio-diretor da Univen, que fabrica gasolina A (pura).
 
Ao pagar imposto com precatórios e importar petróleo bruto de um grupo de países, a Univen, considerada pelo mercado como uma "micro" refinaria de petróleo, consegue vender a gasolina A a um preço menor do que a Petrobras, que detém cerca de 93% do mercado.
 
O litro da gasolina A vendido pela Petrobras, segundo ele, custa cerca de R$ 2,35. O preço da Univen é de R$ 2,28 o litro.
 
"Temos de ter uma vantagem para agradar ao cliente. A Petrobras entrega o combustível, via dutos, diretamente para as bases das distribuidoras. No nosso caso, as empresas têm de vir buscar a gasolina em Itupeva. O custo do frete é da ordem de R$ 0,05 por litro. No final, o preço fica praticamente o mesmo." Os principais clientes da Univen, segundo ele, são Alesat, Ipiranga e Cosan/Esso.
 
De janeiro até setembro, a Univen pagou cerca de R$ 16 milhões de ICMS com precatórios. "Eles [o fisco paulista] estão negando os pedidos [para pagamento com precatórios] todo o mês. Mas essa situação nos deu uma garantia para não pagar o imposto naquele mês. É como se estivéssemos pagando o imposto em juízo. O fato é que uma vez que comprei uma dívida do governo estadual [o precatório], sou credor. Na prática, a Secretaria da Fazenda de São Paulo me deve mais [com o precatório] do que eu devo a ela [de ICMS]. Minha dívida é durante o mês, e a dívida deles comigo é de 30 anos", afirma Malavazzi. Existe polêmica entre advogados e órgãos públicos se o precatório pode ou não ser utilizado para abater créditos de ICMS (leia texto abaixo).
 
Com faturamento de R$ 90 milhões por mês, a Univen informa que "não é fácil competir em um mercado dominado por uma gigante estatal", mas está expandindo seus negócios, principalmente depois que teve autorização da ANP (Agência Nacional de Petróleo), em 2003, para produzir gasolina A.
 
A companhia processa 8.000 barris de petróleo por dia, o que corresponde a uma produção de 35 milhões de litros de gasolina A por mês. Essa gasolina, que é pura, é misturada ao álcool anidro (proporção de 25%) pelas distribuidoras para a fabricação da gasolina C, vendida nos postos de combustíveis.
 
Desde março deste ano, a produção da Univen só cresce. Em julho, produziu 36,9 milhões de litros, o que representou um crescimento de 127% sobre igual mês do ano passado, segundo dados da ANP. "O nosso projeto é processar 20 mil barris de petróleo por dia, o que equivale a uma produção de 70 milhões de litros de gasolina por mês", diz Malavazzi.
 
Desde 2005, segundo ele, já está aprovado pela ANP um projeto para investimento de R$ 180 milhões até 2012 para expandir a produção da refinaria em Itupeva. Com a crise financeira mundial, a empresa diminuiu a velocidade dos investimentos, que foram novamente acelerados neste ano.
 
Para tornar os preços mais competitivos, a Univen procura também trazer petróleo de fora do país -cerca de 50% desse produto é importado do Caribe, da Europa, da Argentina e do Uruguai. "Com a quebra do monopólio do petróleo, a indústria privada passou a investir em produção de gasolina. É um mercado para "cachorro grande", mas vai mudar na medida em que a ANP realizar leilões de áreas em campos para exploração de petróleo que não interessam mais para a Petrobras."
 
Em parceria com a Ral Engenharia, a Univen adquiriu seis áreas para exploração de petróleo na Bacia do Rio do Peixe, na Paraíba. "A matéria-prima [o petróleo] manda no nosso negócio que, aliás, é o único no mundo que opera com cartel, já que é a Opep [Organização dos Países Exportadores de Petróleo] que define os preços do petróleo, e ninguém reclama."
 
 
Diversas empresas usam mesma prática
 
DAS ENVIADAS ESPECIAIS
 
O uso de precatórios para pagar impostos é uma prática disseminada entre as empresas de vários setores, segundo escritórios de advocacia consultados pela Folha.
 
A utilização dos precatórios para pagar débitos com o fisco paulista se intensificou após as dificuldades econômicas enfrentadas em decorrência da crise financeira internacional.
 
Parte desses precatórios é adquirida pelas empresas com descontos que chegam até a 75% do valor de face do crédito.
 
"Pagar tributos com precatórios é um recurso legítimo e constitucional. Há algumas decisões, ainda liminares, mas que não foram contrariadas, do Supremo Tribunal Federal, que favorecem as empresas que pediram para usar precatórios no pagamento de tributos", diz o advogado Igor Mauler Santiago, do escritório Sacha Calmon – Misabel Derzi Consultores e Advogados.
No Estado de São Paulo, o setor de combustíveis é um dos que mais tem entrado com pedidos para pagar o ICMS com precatórios. Por mês, esses pedidos somam cerca de R$ 50 milhões, segundo a Folha apurou. Além desse setor, empresas de energia, bebidas, papel e papelão, plásticos e metalúrgicas também usam precatórios comprados de terceiros para abater dívidas fiscais.
Para os advogados consultados, o uso de precatórios para pagar débitos fiscais está autorizado pela emenda constitucional nº 30, que acrescentou alterações ao artigo 78. "A emenda permitiu que o Estado fizesse o pagamento em até dez anos. E as prestações anuais que não forem liquidadas até o final do exercício a que se referem [até o final de cada ano], podem ser usadas no pagamento de tributos", diz Santiago.
A Secretaria Fazenda paulista não aceita precatórios para abater dívidas fiscais. Em 2006, emitiu comunicado que diz que "a compensação, como forma de extinção do crédito tributário, deve estar prevista em lei que discipline a matéria, conforme menciona o artigo 170 do Código Tributário Nacional". Ou seja: deve haver uma lei estadual para que o crédito do precatório seja usado para pagar ICMS.
Alguns advogados contestam essa orientação. "É absurdo argumentar que é preciso ter uma lei editada pelo Estado. Se de fato fosse necessária, o artigo 78 traria essa exigência por escrito, dizendo nos termos da lei", diz Santiago. Procurado, a Fazenda paulista não comentou o assunto. (CR e FF) 
 

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