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ConJur publica novo artigo de Igor Mauler

08 de março de 2013

A Revista Eletrônica Consultor Jurídico publicou artigo do sócio Igor Mauler Santiago, intitulado “Descontos incondicionais não se sujeitam ao ICMS/ST”, confira:

Descontos incondicionais não se sujeitam ao ICMS/ST

O STJ sempre reconheceu que os descontos incondicionais — sob a forma de redução explícita do preço unitário das mercadorias vendidas ou de entrega “gratuita” de unidades extras ao adquirente (a chamada “bonificação”, estratégia comercial que, economicamente, se reconduz à adoção de preço médio inferior ao registrado na nota fiscal) — não integram a base de cálculo do ICMS.

Igor Mauler passa a colaborar com nova coluna na ConJurA jurisprudência foi ratificada para ambas as modalidades de desconto no REsp 1.111.156/SP (STJ, 1ª Seção, Rel. Min. HUMBERTO MARTINS, DJe 22.10.2009), sujeito à sistemática dos recursos repetitivos, estando ainda cristalizada na Súmula 457 daquela corte[1].

As Turmas de Direito Público divergiam, porém, quanto à aplicação do precedente ao ICMS/ST. Enquanto a maioria da 2ª Turma entendia que os descontos incondicionais concedidos pelo substituto ao substituído, embora reduzissem a base de cálculo do ICMS próprio do primeiro, seriam irrelevantes para a apuração do imposto devido por substituição — o qual seria calculado, portanto, a partir do preço “cheio” —, a 1ª Turma acolhia por unanimidade a tese dos contribuintes de que também o ICMS/ST deveria partir do preço descontado.

No julgamento dos EREsp 715.255/MG (Rel. Min. ELIANA CALMON, DJe 23.02.2011), a 1ª Seção, na oportunidade contando com apenas um ministro da 1ª Turma, por 4 votos a 2 uniformizou a jurisprudência em favor do fisco, ao fundamento de inexistir garantia de que o desconto incondicional dado ao substituído seria por este repassado ao consumidor final, isto é, de que efetivamente se refletiria no preço da operação futura desde logo tributada por antecipação.

logo conjur-cropA nosso ver, ambas as posições podem estar corretas, dependendo da forma de apuração da base de cálculo do ICMS/ST que tiver sido adotada, sutileza para a qual a 1ª Seção não chegou a atentar.

Com efeito, a Lei Complementar 87/1996 estabelece dois mecanismos alternativos para a obtenção da base de cálculo do ICMS/ST.

O primeiro, previsto no artigo 8º, inciso II e parágrafo 4º[2], desdobra-se nas seguintes fases:

1ª etapa: verificação do valor real da operação própria realizada pelo substituto tributário (venda substituto –> substituído);

2ª etapa: inclusão dos valores de seguro, frete e outros encargos cobrados ou transferíveis aos adquirentes; e

3ª etapa: multiplicação da soma das duas parcelas anteriores pela margem de valor agregado (MVA) relativa às operações subsequentes, fixada pelo poder público com base em preços usualmente praticados no mercado.

O segundo, previsto no artigo 8º, parágrafos 2º, 3º e 6º[3], da mesma lei, revela-se de todo independente do valor da operação realizada pelo substituto, baseado que é em preços finais fixados pelos órgãos estatais competentes, sugeridos pelo fabricante ou apurados no mercado pelo fisco.

Pois bem: se a conclusão firmada pelo STJ no EREsp 715.255/MG revela-se perfeita para esta última forma de cálculo da base do ICMS/ST, em que o preço praticado pelo substituto é destituído de toda relevância — importando somente o preço de venda ao consumidor final tabelado pelo poder público ou pelo fabricante, ou apurado pela administração tributária —, o mesmo não se pode dizer quanto ao método da MVA.

Neste último, é a própria lei complementar de normas gerais que, com arrimo no artigo 146, inciso III, alínea a, da Constituição, elege o preço real praticado pelo substituto — para cuja obtenção devem ser deduzidos os descontos incondicionais, na esteira da Súmula 457 do STJ — como ponto de partida do cálculo da base de incidência do ICMS/ST (artigo 8º, inciso II, alínea a, da Lei Complementar 87/1996).

O que parece ter obnubilado, data maxima venia, a visão da maioria é a remissão que o artigo 8º, parágrafo 4º, da Lei Complementar 87/1996 faz aos “preços usualmente praticados no mercado”, para fim de definição da MVA.

É conferir, a propósito, o voto do eminente ministro Mauro Campbell:

Ora, se a base de cálculo na substituição tributária é integrada por pesquisa de preços usualmente praticados no mercado, seja para determinar a margem de valor agregado, seja para determinar o preço a consumidor final, por óbvio que o legislador optou por ignorar o preço efetivamente praticado em determinada operação, sendo irrelevante o valor da operação própria do substituto, de modo que indiferente se ela se deu com a concessão de descontos incondicionados ou não.

O equívoco, com todo o respeito, está em não perceber que os valores usuais de mercado, na sistemática ora em exame, são aferidos para a fixação da MVA, e não diretamente do preço presumido sobre o qual incidirá o ICMS/ST — o que se tem apenas na modalidade substitutiva, disciplinada no parágrafo 6º do mesmo artigo 8º.

E tal margem — quem o diz é a lei — deve ser aplicada sobre o valor real da operação do substituto, e não sobre qualquer outro da preferência do fisco estadual.

Baldo de substrato jurídico, o que já seria bastante, o entendimento do STJ tampouco se justifica por razões econômicas, fundado que está na premissa indemonstrada e inverossímil de que o substituído abdicaria da vantagem competitiva decorrente da aquisição de mercadorias a preços mais baixos do que a média.

O raciocínio aqui defendido aplica-se também às vendas bonificadas, cuja equivalência aos descontos incondicionais é ponto pacífico na jurisprudência do STJ.

Imagine-se a venda de cinco unidades de um bem por R$ 12 cada, com a entrega de uma unidade adicional em bonificação. Admitam-se uma MVA de 50% e uma alíquota de ICMS de 18%. Desconsiderem-se, para fim de simplificação, os custos com seguro, frete e outros.

Numa perspectiva puramente jurídica, ter-se-ão cinco bases presumidas de R$ 18 (R$ 12 + 50%) e uma de zero, correspondente à mercadoria bonificada (R$ 0 + 50%). O ICMS/ST para os primeiros produtos será de R$ 3,24 (R$ 18 x 18%) e, para o último, será 0 (0 x 18%). O débito total de ICMS/ST será de R$ 16,20 (R$ 3,24 x 5 + 0).

Numa visão econômica, calcada na noção de que nenhum comerciante dá as suas mercadorias de graça, o que se tem são seis bens com preço unitário de R$ 10 (R$ 12 x 5/6). A base presumida é de R$ 15 por produto, e o ICMS/ST unitário é de R$ 2,70 (R$ 15 x 18%). O débito total de ICMS/ST será dos mesmos R$ 16,20 (R$ 2,70 x 6).

O que não se admite é a exigência de ICMS/ST relativamente aos seis produtos, considerando-se o preço unitário inicial de R$ 12 (base presumida unitária de R$ 18), a induzir tributação de valor imaginário.

Com efeito, qualquer que seja o ângulo de análise, a verdade é que o valor total da operação substituto –> substituído — ponto de partida para a apuração da base de cálculo do ICMS/ST — foi de R$ 60, e nunca de R$ 72. Certeiras, a esse respeito, as palavras do ministro Castro Meira nos EREsp 715.255/MG:

Qualquer que seja a opção, portanto, bonificação ou redução do valor unitário da mercadoria (desconto incondicional), o resultado é o mesmo, devendo sobre esse valor, e não outro, incidir o ICMS-Substituição, após, é claro, a incidência da margem de agregação. A base de cálculo legalmente prevista não toma como referência o número de cervejas ou lâmpadas que forem destinadas ao comprador, o substituído tributário, mas o valor da operação, no caso, a venda.

A substituição tributária para frente assenta na tributação de valores presumidos a partir de estritos critérios legais, mas repele — o que é coisa diversa — a tributação de valores sabidamente inexistentes.

Diante do exposto e na esteira estudos feitos em conjunto com Donovan Lessa e Marcos Maia[4], somos da opinião de que o precedente do EREsp 715.255/MG é incensurável para os casos em que a base de cálculo do ICMS/ST é obtida a partir dos preços fixados pelo poder público ou pelo fabricante, ou apurados pelo fisco, mas deve ser revisto em relação aos casos submetidos ao regime da MVA, distinção a que ainda pode — e deve — descer a 1ª Seção do STJ.

[1] “Os descontos incondicionais nas operações mercantis não se incluem na base de cálculo do ICMS.”

[2] “Art. 8º A base de cálculo, para fins de substituição tributária, será:

(…)

II – em relação às operações ou prestações subsequentes, obtida pelo somatório das parcelas seguintes:

a) o valor da operação ou prestação própria realizada pelo substituto tributário ou pelo substituído intermediário;

b) o montante dos valores de seguro, de frete e de outros encargos cobrados ou transferíveis aos adquirentes ou tomadores de serviço;

c) a margem de valor agregado, inclusive lucro, relativa às operações ou prestações subsequentes.

(…)

§ 4º. A margem a que se refere a alínea c do inciso II do caput será estabelecida com base em preços usualmente praticados no mercado considerado, obtidos por levantamento, ainda que por amostragem ou através de informações e outros elementos fornecidos por entidades representativas dos respectivos setores, adotando-se a média ponderada dos preços coletados, devendo os critérios para sua fixação ser previstos em lei.”

[3] “Art. 8º, § 2º. Tratando-se de mercadoria ou serviço cujo preço final a consumidor, único ou máximo, seja fixado por órgão público competente, a base de cálculo do imposto, para fins de substituição tributária, é o referido preço por ele estabelecido.

§ 3º. Existindo preço final a consumidor sugerido pelo fabricante ou importador, poderá a lei estabelecer como base de cálculo este preço.

(…)

§ 6º. Em substituição ao disposto no inciso II do caput, a base de cálculo em relação às operações ou prestações subsequentes poderá ser o preço a consumidor final usualmente praticado no mercado considerado, relativamente ao serviço, à mercadoria ou sua similar, em condições de livre concorrência, adotando-se para sua apuração as regras estabelecidas no § 4º deste artigo.”

[4] IGOR MAULER SANTIAGO, DONOVAN MAZZA LESSA e MARCOS CORREIA PIQUEIRA MAIA, Impacto dos descontos incondicionais na formação da base de cálculo do ICMS/ST, na modalidade “margem de valor agregado”. Considerações sobre o EREsp nº 715.255/MG, In Revista Dialética de Direito Tributário nº 201. São Paulo: Dialética, junho de 2012, p. 100 e ss.

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