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Revista Negócios ouve Eduardo Maneira: tsunami tributário


A Revista Negócios, de Pernambuco, ouviu o professor Eduardo Maneira em reportagem intitulada “Um Tsunami Tributário”, confira:

Um tsunami tributário

Por Drayton Nejaim | Foto de Bosco Lacerda

Juristas, advogados, professores das mais renomadas universidades de Direito e representantes do Judiciário e do Fisco Nacional vivem dias de controvérsias e surpresas diante de julgamentos que agora se baseiam na jurisprudência, a fi gura do Direito que multiplica decisões a partir do seu surgimento. Essa mudança de perfi l decisório provoca um clima de insegurança jurídica que pode representar um relevante obstáculo à manutenção dos investimentos econômicos no Brasil.

Para Mary Elbe Queiroz, tributarista pernambucana com pós-doutorado em Direito Tributário pela Universidade de Lisboa, o Brasil presencia uma mudança de paradigmas jurídicos sintonizada com a conduta norte-americana, que consolidou julgamentos com base na jurisprudência. “Com isso, estamos deixando para trás a tradição brasileira de julgar em cima do que está escrito na lei, considerando que o que não está vedado ou proibido pode ser permitido”, alerta a especialista. Segundo ela, na área tributária esse ativismo jurisprudencial, em que juízes tentam substituir o legislador, apresenta a forma de um “tsunami tributário”, varrendo atos jurídicos ou negócios que não violam a lei e que eram baseados em sinalizações do planejamento tributário legal.

Para aprofundar os reflexos desse cenário, a doutora comanda a realização do XII Congresso Internacional de Direito Tributário de Pernambuco, que se realiza no Recife de 26 a 28 de setembro, tendo como tema central “Jurisprudência tributária e segurança jurídica: do Estado da legalidade tributária ao Estado de precedentes”. O evento fomentará a discussão dos aspectos tributários que se refletem diretamente na economia brasileira e reunirá ministros de tribunais federais, auditores, advogados e professores de universidades do Brasil e da Europa, além do ministro-chefe da Advocacia Geral da União, Luiz Inácio Adams, e do secretário da Receita Federal do Brasil, Carlos Alberto Barreto.

Um dos assuntos discutidos no encontro será a inconstitucionalidade (declarada pelo ministro do STF, Gilmar Mendes) dos incentivos fiscais – como descontos e isenções do ICMS – oferecidos pelos Estados para atração de empreendimentos como fábricas e centrais de distribuição. A posição do ministro deixa claro que qualquer isenção, incentivo, redução de alíquota ou de base de cálculo, crédito presumido, dispensa de pagamento ou outro benefício fiscal relativo ao ICMS, concedido sem prévia aprovação em convênio celebrado no âmbito do Confaz (Conselho Nacional de Política Fazendária) é inconstitucional. Como relator da Proposta de Súmula Vinculante nº 69, o ministro Gilmar Mendes acredita que dará fim à guerra fiscal entre os Estados simplesmente impedindo-os de aprovar incentivos fiscais.

A súmula ainda precisará ser aprovada pelo Senado Federal, mas já propicia um ambiente de insegurança jurídica. Na opinião do professor e livre-docente de Direito Tributário da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (FD/USP) Heleno Taveira Torres, a perspectiva da aprovação já atua atrasando investimentos. “Muitas empresas, inclusive multinacionais, estagnaram ou bloquearam a instalação de filiais no Brasil até que seja decidida esta inconstitucionalidade. Dessa maneira, perdem os empresários e perde o Estado, que deixa de recolher tributos”, afirma Torres, que será o presidente do congresso internacional previsto para setembro na capital pernambucana.

Para Heleno, as empresas precisam saber o que vai acontecer com a estrutura de crédito já concedida e com os critérios para os créditos futuros. “Um grau de insegurança destes compromete toda a Economia. O País precisa ter responsabilidade com a segurança jurídica dos investimentos”, alerta o professor da USP, para quem os governadores e senadores não estão se movimentando como deveriam para evitar essa instabilidade jurídica.

Também advogado de grupos empresariais, Heleno revela que, hoje, tudo o que o contribuinte faz para o planejamento tributário do uso dos incentivos fiscais fica sob suspeita. “O certo é sempre provisório”, resume. Segundo ele, até o Ministério Público se sente no direito de, em alguns casos, desconstituir coisa julgada de incentivos e tributos por meio de ações civis públicas para desconstituir atos jurídicos perfeitos. “É um absurdo. Ataques à liberdade e ao sistema jurídico que não se podem tolerar. Para os contribuintes, resta a esperança de buscar o Judiciário, o que termina aumentando o nível de conflitividade”, afirma o advogado.

Polêmica envolve o Ministério Público

Como exemplo, Heleno cita o caso do Ministério Público, que tem exigido, sem respaldo legal, ICMS de incentivos de empresas. Há um caso em São Paulo em que o Ministério Público vem cobrando de usinas e cooperativas de açúcar uma contribuição da Lei nº 4.870/1965 que, editada há 47 anos, não foi inserida na Constituição Federal. O Instituto do Açúcar e do Álcool (IAA) foi extinto e, ainda assim, o Ministério Público entra com ação contra a União pedindo a restituição de uma contribuição já extinta.

O presidente da Associação Brasileira de Direito Tributário (ABRADT), Eduardo Maneira, diz que esta nova experiência vivenciada pelo Brasil, com a aplicação em massa dos precedentes jurídicos, amplia a complexidade das sentenças. Uma decisão vinculante pode repercutir em outros casos que podem ser parecidos, mas não são iguais, gerando equívocos que, para se desfazerem, encontrarão dificuldades.

O ativismo judicial, segundo ele, surge num momento em que Judiciário nunca esteve em tanta evidência. “Nunca os ministros do STF foram tão conhecidos. Por mais positivo que isto seja, revela um desequilíbrio. Nunca o Legislativo esteve tão fraco e o Judiciário tão forte. A separação clássica dos três poderes está em xeque”, aponta Maneira. Para ele, a discussão deste cenário (no Congresso Internacional de Direito Tributário, no Recife) com a participação do meio acadêmico, da magistratura e de advogados levará à busca de soluções para os advogados que, no exercício da profissão, se angustiam diante das mudanças constantes.

Mas, além dos advogados, a instabilidade jurídica reina também para outra categoria que, diretamente, atua no planejamento tributário e no cumprimento das responsabilidades das empresas: os profissionais contábeis. A vice-presidente do Conselho Federal de Contabilidade (CFC), Verônica Souto Maior, revela que a intranquilidade jurídica foi acentuada a partir de janeiro de 2010, quando o Brasil adotou as normas internacionais de contabilidade, seguindo o International Financial Reporting Standards (IFRS) – o padrão internacional de contabilidade – a fim de oferecer mais equidade às empresas brasileiras num mundo globalizado, sem aumento de tributos.

As lacunas surgiram quando o Fisco, que sempre usou a contabilidade para apurar os tributos, encontrou mudanças em vários aspectos. A solução, segundo Verônica, está em estudo na Receita Federal, que persegue um maior conforto jurídico com uma base legal que atualizaria a legislação vigente, ainda da década de 1970, para apuração do lucro tributável. “É uma necessidade do governo que exista uma lei que atualize a base anterior e defina o tratamento das empresas nacionais a partir do IFRS”, afirma a vice-presidente, salientando a importância da mesa que discutirá a relação entre o Direito Tributário e a Contabilidade no congresso do próximo mês, no Recife.

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