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Tiago Conde Teixeira na ConJur: Revogação da contribuição ao Sebrae-Apex-ABDI deve ser reconhecida



O artigo intitulado “Revogação da contribuição ao Sebrae-Apex-ABDI deve ser reconhecida”, de autoria de Tiago Conde Teixeira, sócio do Sacha Calmon – Misabel Derzi Consultores e Advogados (SCMD), foi publicado pela revista eletrônica Consultor Jurídico.

Revogação da contribuição ao Sebrae-Apex-ABDI deve ser reconhecida

Por Tiago Conde Teixeira

O STF, em 23 de novembro de 2010, reconheceu a repercussão geral do RE nº 603.624/SC (Tema nº 325), no qual se discute a subsistência da contribuição destinada ao Sebrae, à Apex e à ABDI após o advento da EC nº 33/2001. Esse recurso foi interposto em face de acórdão proferido pelo TRF-4, que decidiu pela exigibilidade dessa contribuição incidente sobre a folha de pagamento.

A contribuição ao Sebrae foi instituída pela Lei nº 8.029/1990, tendo por base de cálculo a folha de salários do contribuinte. O objetivo inicial dessa contribuição era implementar uma política de apoio às micro e pequenas empresas. Em seguida, com as alterações legislativas, a contribuição também passou a ser destinada ao desenvolvimento industrial, bem como à promoção de exportações e do turismo brasileiro internacionalmente. Assim, parte do valor arrecado passou a ser destinado para a Apex, a ABDI e a Embratur.

Em que pese o §3º do artigo 8º da Lei nº 8.029/1990 se referir à contribuição ao Sebrae como adicional às contribuições devidas às entidades do Sistema S, o STF [1] já decidiu que se trata de contribuição de intervenção no domínio econômico. Isso decorre das finalidades para as quais foi instituída a exação, quais sejam, a preservação da ordem econômica, bem como o tratamento privilegiado às pequenas e micro empresas e a promoção de exportações e desenvolvimento industrial, de modo a concretizar os objetivos estabelecidos pelo artigo 170 da CF.

Nesse diapasão, o ministro Gilmar Mendes, em seu voto no julgamento do RE 635.682, destacou que, por se tratar de Cide, deve ser aplicado à contribuição ao Sebrae o artigo 149 da CF/1988, e não o artigo 240, que disciplina as contribuições destinadas às entidades do Sistema S. Essa distinção é relevante porque o artigo 240 autoriza a incidência das contribuições a entidades terceiras sobre as folhas de salário, enquanto não há tal previsão no artigo 149, ao qual a contribuição ao Sebrae deve obediência.

Nesse ponto, elucida-se que as análises feitas pelo STF acerca da classificação da contribuição ao Sebrae-Apex-ABDI declararam a constitucionalidade da exação instituída pelo artigo 8º da Lei nº 8.029/1990. Contudo, nenhuma das ações que chegaram a esse posicionamento analisou a questão à luz das alterações promovidas pela Emenda Constitucional nº 33/2001 no artigo 149 da CF/1988, base constitucional da cobrança.

Tendo em vista a sua natureza de Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico, invoca-se a aplicação do artigo 149 da CF à contribuição ao Sebrae, e não o artigo 240, que disciplina as contribuições destinadas aos serviços sociais autônomos (Sistema S) e permite a sua incidência sobre a folha de salários.

O artigo 149, em sua redação original, não previa as bases econômicas passíveis de tributação pelas contribuições sociais e as contribuições de intervenção no domínio econômico. Assim, a União possuía grande discricionariedade para instituí-las e definir a sua base de cálculo, sem a necessidade de observar limites quanto às materialidades passíveis de tributação.

Nesse cenário, com o advento da EC nº 33/2001, que acrescentou o §2º ao artigo 149 da CF, as contribuições sociais e as contribuições de intervenção no domínio econômico também passaram a adotar, além do critério da finalidade, o critério das bases econômicas a serem tributadas. Assim, o texto constitucional passou a prever as bases de cálculo sobre as quais essas espécies de contribuições especiais poderiam incidir, limitando a competência tributária da União para instituí-las.

Com a nova redação, estabeleceu-se que as referidas contribuições especiais poderão adotar alíquotas: I) ad valorem, tendo por base o faturamento, a receita bruta ou o valor da operação e, no caso de importação, o valor aduaneiro; ou II) específica, tendo por base a unidade de medida adotada.

Faz-se mister destacar que o plenário do STF, por unanimidade, no julgamento do RE nº 559.937/RS [2], submetido à sistemática da repercussão geral, entendeu que o rol de bases econômicas elencado no §2º, III, do artigo 149 da CF, introduzido pela EC nº 33/2001, possui caráter taxativo. No caso acima referido, a Suprema Corte tratou de contribuições sociais incidentes sobre a importação, hipótese prevista no artigo 149, §2º, III, “a”, da CF/1988. Nesse cenário, determinou-se a impossibilidade de o ICMS integrar a base de cálculo do PIS-Importação e da Cofins-Importação, tendo em vista que extrapola o conceito de “valor aduaneiro” previsto no dispositivo mencionado.

Diante dessa decisão da Suprema Corte, evidencia-se que, caso o legislador opte pela alíquota ad valorem para instituir contribuição social ou Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico, ele só poderá adotar as bases de cálculo introduzidas pela EC nº 33/2001, quais sejam, o faturamento, a receita bruta ou o valor da operação e, no caso da importação, o valor aduaneiro, conforme estabelecido pelo artigo 149, §2º, III, “a”, da CF.

Nessa toada, é fundamental destacar a prevalência dos conceitos fechados no âmbito do Direito Tributário, tendo em vista a necessidade de se preservar a segurança jurídica e a esfera de direitos do contribuinte. Assim, a Constituição, ao outorgar a competência aos entes para instituir e majorar impostos, também estabelece limites ao poder de tributar, com vistas a evitar abusos por parte do Estado e garantir aos cidadãos os direitos instituídos pelo texto constitucional [3]. Esses limites devem ser respeitados de forma rigorosa pelo legislador infraconstitucional ao instituir determinado tributo.

A intenção do constituinte, portanto, ao prever expressamente as bases de cálculo sobre as quais as Cides podem incidir, foi restringir a discricionariedade do legislador infraconstitucional. Com o advento da EC nº 33/2001, a base de cálculo das Contribuições de Intervenção no Domínio Econômico foi elevada a nível constitucional, de modo que não cabe ao legislador ordinário instituir Cide incidente sobre base de cálculo não prevista na Constituição.

À luz desse novo paradigma, é fundamental analisar a compatibilidade material tanto das contribuições sociais e contribuições de intervenção no domínio econômico instituídas antes do advento da EC nº 33/2001 como as que foram instituídas depois da sua entrada em vigor, com a Constituição Federal. Isso decorre da necessidade de se garantir a coerência do sistema jurídico, de modo que todas as normas devem estar em harmonia com a Constituição, que é o fundamento de validade do ordenamento jurídico [4].

Em suma, tem-se que: I) a Lei nº 8.029/1990 instituiu a contribuição ao Sebrae, estabelecendo, como sua base de cálculo, a folha salarial do contribuinte; II) conforme entendimento do STF, a contribuição ao Sebrae não é um adicional às contribuições do Sistema S, conforme dispõe a Lei nº 8.029/1990, e, sim, uma Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico; III) em se tratando de Cide, a contribuição ao Sebrae é disciplinada pelo artigo 149 da CF; e IV) a partir da EC nº 33/2001, que acrescentou o § 2º ao artigo 149 da CF, o texto constitucional passou a prever as bases de cálculo sobre as quais as Cides poderiam incidir, sendo elas o faturamento, a receita bruta ou o valor da operação e, no caso de importação, o valor aduaneiro.

No caso das contribuições ao Sebrae-Apex-ABDI, o legislador infraconstitucional adotou alíquotas ad valorem incidentes sobre a folha de salários, base de cálculo que não consta no rol taxativo do §2º, III, “a”, do artigo 149 da CF/1988, conforme redação dada pela EC nº 33/2001. Conclui-se, portanto, que a incidência da contribuição ao Sebrae-Apex-ABDI, instituída pela Lei nº 8.029/1990, com as modificações posteriores, sobre a folha de pagamentos é incompatível com a Constituição. Assim, deve ser reconhecida a revogação da referida exação a partir da entrada em vigor da EC nº 33/2001.

[1] Nesse sentido, ver: STF. RE nº 396266, Rel. Min. Carlos Velloso, Plenário, julgado em 26/11/2003, DJ de 27/2/2004; STF. RE 635682, Relator(a): Min. Gilmar Mendes, Plenário, julgado em 25/4/2013, DJe de 23/5/2013.

[2] STF. RE 559937, Relator(a): Min. ELLEN GRACIE, Relator(a) p/ Acórdão: Min. DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 20/03/2013, REPERCUSSÃO GERAL – MÉRITO DJe-206 DIVULG 16-10-2013.

[3] BALEEIRO, Aliomar; Derzi, Misabel Abreu Machado. Direito Tributário brasileiro: CTN comentado. 14ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 2018, p. 75.

[4] MENDES, Gilmar Ferreira. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 107.

Tiago Conde Teixeira é sócio do escritório Sacha Calmon Misabel Derzi Consultores e Advogados, mestre em Direito Público pela Universidade de Coimbra (Portugal), professor de Direito Tributário do Instituto Brasiliense de Direito Público, presidente da Comissão de Assuntos Tributários da OAB-DF e membro efetivo da Câmara de Tributação da Fecomércio.

Revista Consultor Jurídico, 6 de junho de 2020.

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