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Tiago Conde revela desafios à frente da Comissão de Assuntos Tributários da OAB-DF

19 de março de 2019

Em entrevista ao Portal Jota, o sócio do SCMD Tiago Conde comenta os desafios que terá à frente da Comissão de Assuntos Tributários da OAB-DF.

‘Brasileiro não paga tributo porque não sabe o que pagar’

Tiago Conde, novo presidente da Comissão de Assuntos Tributários da OAB/DF, defende simplificação de tributos.

Aproximar o cidadão comum dos advogados é o grande desafio proposto pelo novo presidente da Comissão de Assuntos Tributários da seccional do Distrito Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-DF), Tiago Conde. Ele tomou posse em janeiro deste ano e diz apostar em programas de educação fiscal como grande norte de sua gestão.

Ao JOTA, ele diz que quer tanto a informação básica, para que a população entenda a importância e a razão do pagamento dos tributos, quanto a qualificação de advogados da área. “O brasileiro não paga tributo porque não sabe o que pagar”, afirma.

Conde defende a simplificação e a unificação dos tributos nacionais como principais pontos a serem tratados em uma reforma tributária. Para ele, o sistema de cobrança atual é preponderantemente baseado no consumo, o que reforça a desigualdade social.

Ele também comentou temas que têm sido tratados no governo Bolsonaro. Defendeu, por exemplo, a manutenção e instituição de programas de parcelamento fiscal. Sobre a tributação de dividendos, disse que o governo deve tratar o tema com “parcimônia” e sem pressa.

Veja a entrevista completa:

Qual será a sua prioridade à frente da comissão?

Eu quero trazer a OAB mais para perto do cidadão. Além de dar suporte ao advogado, dar também qualificação a ele, por meio de cursos da ESA [Escola Superior de Advocacia do Distrito Federal]. Tem uma pecha muito grande contra advogado, mas o advogado é essencial na defesa do contribuinte, seja a defesa errada, de onde sai uma jurisprudência, uma orientação do que o contribuinte não deve fazer, ou seja uma defesa exitosa, quando há uma resposta do que o cidadão pode fazer.

De que forma inserir a população nas discussões e decisões tributárias do país?

Informando. Talvez hoje não tenhamos o público efetivo para falar que tipo de tributo ele deve pagar.

A informação gera cidadania fiscal e gera cidadãos conscientes. Se eu perguntar para um cidadão desinformado: o que você acha ideal na Reforma Tributária? Ele vai dizer: ‘Ah, não pagar’. Não pagar não pode. Então, a educação fiscal fala exatamente isso: você tem que pagar para ter esse resultado. É acesso à informação aliado à conscientização.

Em um cenário ideal, quais são os grandes pontos a se propor em uma Reforma Tributária nacional?

No meu sentir, a grande saída para a tributação chama-se simplificação. Quanto mais simples for o processo, mais simples for o pagar tributo, mais eu vou ter cidadania fiscal e tributos pagos. O brasileiro não paga tributo porque ele não sabe o que pagar, como pagar. Se eu simplifico, vou ter uma arrecadação maior. O IVA, o imposto único, é uma saída efetiva de simplificação.

Outro grande problema que eu vejo: a tributação ser muito regressiva no nosso país.

Presta atenção: você e a moça que trabalha na sua casa. Quando há desoneração da cesta básica, você também come arroz e feijão, como ela. Só que o impacto no bolso dela é um. No seu, é quase zero. Ou seja: eu tenho que tratar os desiguais como desiguais, como a Constituição manda. É preciso fazer políticas voltadas a eles, como eu tenho no Canadá, onde a pessoa vai a uma espécie de prefeitura e se declara pobre. Sem nenhum impedimento devolvem o dinheiro do imposto.

E você acha que o atual governo está disposto a pensar em soluções para os mais pobres?

Eu acho. Acho que o governo está disposto a cortar gordura, tributar quem ganha mais, tributar bem menos quem quase não ganha. O Bolsa Família, por exemplo, é o maior programa de distribuição direta de renda do mundo. É um programa belíssimo, na minha opinião. Mas, de tudo o que pago, 70% eu devolvo em impostos para o estado. É um Robin Hood às avessas. Ou seja: o programa é ótimo, só que nosso sistema tributário é ruim, porque aquela pessoa só compra gênero de primeira necessidade. O impacto da tributação para ele é muito grande.

A equipe econômica do governo tem tentado facilitar o acerto de dívidas com grandes devedores. Você é favor?

Transacionar é a grande saída. O crédito tributário é indisponível. O Estado não pode dispor dele à sua livre vontade. Mas, muitas vezes, os juros, que realmente dão muita gordura no crédito, podem ser revistos. Já acontece isso hoje, por meio de Pert [Programa Especial de Regularização Tributária], de Refis, etc.

É uma saída importante. É o que pode tirar o nosso empresário do buraco.

Qual é sua opinião sobre tributar dividendos?

A tributação de dividendos tem que ser vista com muita parcimônia pelo governo, porque vai interferir diretamente na quantidade de investimentos que temos no país. Muitas vezes as empresas fazem planejamentos tributários gigantescos, investem no país, exatamente esperando uma resposta efetiva disso. Se não tem gera muita frustração e aumenta o risco do país também. Isso é muito, muito problemático.

Não acho que é uma política desarrazoada não se tributar dividendos, porque eu estou investindo diretamente no país, estou tratando uma série de situações em benefício para o Estado. Acho que essa questão específica o governo teria que deixar para um segundo momento. Às vezes facilitar a arrecadação do que a gente já tem é uma saída muito melhor.

E sobre a redução na alíquota do Imposto de Renda Pessoa Física, o que o senhor pensa?

Antes de tudo, é preciso corrigir a tabela do Imposto de Renda. Isso é uma vergonha. Eu, há cinco anos, venho ganhando aumento com a inflação. Daqui a pouco a alíquota do Imposto de Renda me pega [o contribuinte passa a pagar mais], mas eu não tive aumento efetivo.

No mínimo, a inflação tinha que corrigir. Isso é Justiça. O que se pode fazer para criar Justiça fiscal é aumentar as faixas de tributação. Que Justiça é essa? Quem ganha R$ 100 mil paga 27,5%. Quem ganha R$ 1 milhão, 27,5%. A grandeza é muito diferente. O impacto disso dentro do orçamento familiar também é. Então, tenho que criar mais faixas para tributar.

Outra grande questão que se discute neste momento no país é a possibilidade ou não da instituição de parcelamentos tributários. Qual é sua opinião sobre o assunto?

O pessoal fala que é favorecer o devedor contumaz, o cara que não quer pagar tributo. Não é. Em alguns casos pode acontecer, mas, em muitos, salva a empresa.

Se mato hoje uma fabricante, estou jogando milhares de empregos e a possibilidade de arrecadação maior no lixo. Por outro lado, tem que ter uma forma de restringir o parcelamento, para que não vire uma rotina. Mas não se criar novos é um absurdo.

O senhor diz que quer priorizar o diálogo com o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) durante sua gestão. Qual é a principal questão a se discutir com os conselheiros?

Procedimento. O problema é só procedimental. Retirada de pauta, recebimento de advogados. Eu adoro esse negócio de receber [advogados para audiências] com câmeras. É muito fácil. Não ocupa meu tempo – aliás, otimiza, dois, três conselheiros juntos.

Só que isso precisa ficar mais rápido. Nem sempre estamos conseguindo audiência com todos os conselheiros, não por maldade. Vamos tentar ver, em conjunto, uma forma de otimizar isso. Aquilo ali é o nosso direito de defesa, direito de defesa do nosso contribuinte. Às vezes é importante esclarecer algum ponto que não está na sustentação oral ou que é muito técnico, para fomentar o debate. [É preciso] estabelecer procedimentos que todas as câmaras cumpram a partir dali. Isso vai facilitar a vida de todo mundo.

A possibilidade de extinção do Carf é um tema que recorrentemente volta à discussão. O que você pensa a respeito?

Eu acho um completo absurdo falar em extinguir um órgão tão importante para o jurisdicionado e para a Justiça.

Muitos dos meus clientes, hoje, quando perdem no Carf, já decidem pagar o tributo devido, porque eles veem que passaram por um julgamento justo. Falar em acabar com o Carf é o mesmo que acabar com a celeridade e acabar com o Judiciário de vez. O Judiciário não dá conta. Olhe os números da vara de execução fiscal do Distrito Federal. O cara [o juiz] tem execução fiscal cativa dele. Não julga. Aí vem a Receita dizer que tem bilhões parados em créditos tributários. Vai continuar parado, só que na Justiça.

ERICK GIMENES – Repórter

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